Especialistas reunidos no evento confirmaram o panorama sombrio de aumento das emissões de gases de efeito estufa, paralisia e incerteza nas negociações sobre um futuro acordo climático internacional. Por outro lado, assinalaram uma mudança na postura da sociedade e dos governos no Brasil e no mundo que antecipam tendências importantes no caminho de uma economia de baixo carbono.
“Considerando a taxa de crescimento econômico dos países emergentes e a lentidão para que ela se estabilize nos países desenvolvidos, não há perspectiva de inflexão nessa curva [de aumento das emissões]”, afirmou Carlos Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e integrante do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês). Nobre deixou claro que os eventos climáticos extremos recentes, como as cheias no Paquistão e a grande seca na Rússia, são indícios muito fortes de que os impactos das mudanças climáticas já estão sendo sentidos. De acordo com os cientistas do clima, o aquecimento global deve tornar fenômenos semelhantes mais intensos e frequentes.
No mesmo sentido foi a secretária executiva do Programa de Mudanças Climáticas do Estado de São Paulo (Proclima), Joseline Ferrer. “Mudança climática não é mais um cenário, mas um processo instalado”, advertiu.
Carlos Nobre mencionou ainda estudos recentes que indicam que as alterações do clima guardam uma bomba-relógio: os extremos climáticos podem destruir a capacidade dos ecossistemas de retirar gás carbônico do ar e transformá-los em emissores, como no grande incêndio florestal da Rússia. Pode liberar ainda grandes quantidades de metano aprisionadas no fundo do mar e em solos congelados. O metano tem um potencial até 20 vezes maior que o CO2 de aquecer a atmosfera.
Indefinição internacional
“O cenário nos leva a crer que precisaremos de muitos anos de trabalho para que os governos cheguem a acordos que nos permitam dizer que haverá um regime e uma legislação internacionais consistentes”, lamentou na abertura do seminário Márcio Santilli, coordenador do Programa de Política e Direito Socioambiental (PPDS) do ISA. Ele ponderou que, diante de todas as incertezas do cenário internacional, é preciso lutar pela implementação da política e das metas nacionais. Daí a ideia de realizar o seminário.
“Copenhague foi uma ruptura. Há um compromisso de metas dos grandes emissores, mesmo que elas sejam insuficientes”, considerou Eduardo Viola, professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília. Para ele, apesar do impasse nas negociações do acordo internacional sobre o clima, a proposição de metas nacionais da parte desses países pode ser considerada um avanço diante da atitude defensiva da maioria dos governos, inclusive o brasileiro, existente até há alguns anos. “De acordo com o que foi definido em Copenhague, mais de 80% das emissões mundiais estão sobre algum tipo de meta”.
Viola prevê que o acordo climático não deve sair antes de 2013 – isso caso o presidente dos Estados Unidos, Barak Obama seja reeleito e se disponha a negociar com a China. Chineses e estadunidenses são os maiores emissores mundiais. O pesquisador acredita que os investimentos feitos especialmente pela China e países da Europa em tecnologias e energias sustentáveis podem ser considerados sinais de que há disposição de diminuir as emissões de gases de efeito estufa.
Viola acredita que a Lei Nacional de Mudança Climática, aprovada em novembro do ano passado, também pode ser considerada um avanço, mesmo que suas metas não sejam obrigatórias. O especialista crê que a aprovação da norma credencia o Brasil a ser um protagonista nos fóruns internacionais e reflete um processo importante de conscientização de empresários, sociedade civil e governos sobre a vulnerabilidade do País às mudanças climáticas.
A diretora de Mudanças Climáticas do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Thais Juvenal, fez uma apresentação sobre a implementação da Lei de Mudanças Climáticas. Ela informou que o inventário nacional de emissões e a maior parte da regulamentação da lei estarão prontos até o final do ano. De acordo com a diretora, será detalhada a regulamentação das metas de redução de emissões relativas ao desmatamento na Amazônia e no Cerrado, agropecuária, energia e substituição na siderurgia do carvão de madeira nativa por madeira plantada. A regulamentação das metas de outros segmentos importantes, como transporte, construção civil e indústria de transformação, vai ficar para o próximo governo.
O objetivo do seminário é ampliar a discussão, entre as organizações da sociedade civil, sobre as metas nacionais e setoriais de redução de emissões de gases de efeito estufa e qualificar essas organizações para intervir nos diversos fóruns e políticas sobre o assunto. A ideia é também tentar influenciar as plataformas dos candidatos à Presidência da República e o programa do próximo governo. Um conjunto de recomendações sobre a política brasileira de mudanças climáticas será encaminhada ao governo e aos presidenciáveis ao final do evento. Os partidos políticos dos principais candidatos foram convidados a participar, mas só o PV enviou um representante.
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