O padre Josafá Carlos Siqueira, de 58 anos, é o primeiro reitor a assumir uma universidade de porte do País com uma agenda marcadamente ambiental. "Minha mãe se chama Orquídea. Acho que já nasci com a vocação para cuidar de plantas e admirar sua beleza", diz Siqueira, que comanda a Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio desde julho. Nascido em Pirenópolis, cerrado goiano, ele virou seminarista depois de se formar em Biologia, por influência de um primo que era padre. Não vê conflito entre sua opção religiosa e a ciência. "Se queremos resolver os grandes problemas do planeta, temos de religar as duas pontas", diz. "Devemos enxergar a natureza como criação divina que precisa ser respeitada e preservada a partir do conhecimento científico."
Como nasceu a proposta da agenda ambiental para a PUC?
Veio do fortalecimento do Núcleo Interdisciplinar de Meio Ambiente, que fundamos em 1999 com o objetivo de acolher ideias sobre meio ambiente na universidade, criar projetos de pesquisa e atuar em parceria com poder público e iniciativa privada, fundamentalmente em educação ambiental. Embora a proposta da agenda seja da reitoria, ela nasceu desse grupo de alunos e professores. O objetivo é dar nosso testemunho de sustentabilidade, mostrar para a sociedade como lidamos com as questões ambientais na PUC. É uma pequena semente, mas que, por analogia, pode se tornar um pau-mulato (árvore que alcança 40 metros de altura).
De que maneira?
Com o estabelecimento de metas a curto, médio e longo prazo, tanto no nível de gestão quanto de ensino e pesquisa. A agenda envolve diversas áreas: biodiversidade, água, energia, atmosfera, materiais, resíduos e educação ambiental. Neste momento, estamos priorizando as ações de curto prazo, como reduzir o consumo de papel, ter maior controle sobre consumo de água e energia e preservar as árvores do câmpus. A PUC está no coração do pouco que resta de mata atlântica no Rio.
É difícil conciliar vocação religiosa e a atividade científica?
Nunca encontrei dificuldade, até porque estamos vivendo em outro momento histórico, que não é mais aquele do conflito apologético entre religião e ciência. Se queremos resolver os grandes problemas do planeta, temos de religar as duas pontas e construir uma visão mais ampla das questões. Devemos enxergar a natureza como criação divina que precisa ser respeitada e preservada a partir do conhecimento científico.
Após quase 70 anos, a PUC terá uma graduação em Biologia. Por que demorou tanto?
O curso nasce com uma proposta diferenciada, depois de um longo processo de consolidação do discurso ambiental na universidade. Hoje temos mais de cem disciplinas ligadas a temas ambientais, em todos os departamentos. Nestes mais de 30 anos em que milito na área, pude perceber as ideias formidáveis e os limites na formação do biólogo. O maior deles é a falta de um conhecimento interdisciplinar.
Qual é o projeto do curso?
Queremos um profissional preparado para enfrentar os grandes desafios ambientais do futuro – mudanças climáticas, bioinvasão (migração de espécies que pode desequilibrar hábitats) – a partir de várias áreas do conhecimento.
O que o sr. acha de o tema sustentabilidade ter entrado na agenda destas eleições?
É evidente que todos os candidatos querem agregar a sustentabilidade a seus discursos, porque todos nós temos consciência da importância do tema. Mas é preciso tomar cuidado, ver quais são os fundamentos dessa opção pelo ambiental, qual a ética que está por trás. Sem dúvida, é preciso aliar o desenvolvimento à preservação.
Fonte: Carlos Lordelo - Jornal O Estado de S. Paulo
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