quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Cancun enfrenta polêmica sobre novo prazo para protocolo de Kyoto

Após um dia de discursos em defesa do consenso, a 16ª Cúpula da ONU sobre Mudanças Climáticas chega ao seu segundo dia e a temperatura das negociações esquenta. O negociador chefe do Brasil na COP-16, embaixador Luiz Alberto Figueiredo, afirmou que é preciso avançar rápido na substituição do protocolo de Kyoto, principal questão a ser tratada no encontro, visto que a vigência deste protocolo vai apenas até 2012.

A cena em Cancun é complicada, porque a grande pauta do Grupo dos 77 países mais China é que haja uma emenda para um segundo período de compromisso do Protocolo de Kyoto, que é o centro das negociações, no entanto as probabilidades um pacto deste tipo ainda parece distante.

Para o embaixador Luiz Alberto Figueiredo, negociador chefe do Brasil na Conferência do Clima (Cop-16), embora não haja um prazo formal para as decisões sobre a substituição do protocolo de Kyoto, é preciso avançar rápido, caso contrário não haverá nenhuma implementação nem neste, nem nos próximos anos. Uma das grandes discussões da COP-16 é saber que o que será feito quando o protocolo sair de vigência, em 2012.

“Estamos aqui, depois de Copenhague, para andar para frente. Muitos vão dizer que os problemas de Copenhague, como a crise econômica, dificuldades políticas, permanecem e que o cenário não mudou. Mesmo assim, acreditamos que vamos sair de Cancún com um resultado positivo de adotar ações direcionadas”, disse Figueiredo.

Responsabilidade maior

Outros embaixadores da América Latina concordam com Figueiredo acerca da importância do tema, mas jogam o peso da responsabilidade dos chamados países desenvolvidos para o sucesso das negociações de forma mais incisiva: "este é o tema mais controverso, não é financiamento, nem a transferência de tecnologia, mas a limitação do aquecimento global, medida que exige que os países desenvolvidos reduzam suas emissões entre 2012 e 2017", considerou o embaixador da Bolívia para as Nações Unidas, Pablo Solón.

Mas a realidade é que "os países desenvolvidos não querem aporvar nesta reunião a introdução de um segundo período de compromisso do protocolo de Kyoto", avalia Solón, que também é o negociador-chefe de seu país nas questões do aquecimento global. "Esta reunião de Cancun terá sucesso se houver uma emenda com reduções drásticas nas emissões nos próximos anos, que permitam estabilizar a temperatura em 1,5 graus Celsius para menos, até um aumento máximo de um grau", disse o diplomata.

Na sua opinião, o que coincide com os representantes dos outros países em desenvolvimento, se esta alteração não for aprovada, haverá uma lacuna na implementação do protocolo após o primeiro período que termina em 2012, e uma situação em que os níveis de emissão poderão disparar de forma incontrolável. "Isso vai causar um aumento da temperatura em mais dois, três ou quatro graus Celsius, com conseqüências terríveis para a humanidade e a vida no planeta como um todo", disse o embaixador.

Kyoto ou Conpenhague?

O protocolo de Kyoto foi adotado nessa cidade japonesa em 1997, não foi ratificado pelos Estados Unidos, e apresenta o objetivo de reduzir até 2012 as emissões de gases de efeito estufa em uma média de 5,2 por cento, em comparação com os níveis 1990. O acordo deixa de valer a partir de 2012, fato que torna urgente alguma decisão sobre um novo tratado global.

De acordo com o embaixador brasileiro, há duas correntes sobre este assunto. Alguns países defendem que o ideal seria estender as mesmas metas do Protocolo de Kyoto por mais dois anos, enquanto outros acreditam que o melhor seria cruzar os números discutidos no acordo de Copenhague e implementá-lo provisoriamente.

Mesmo com as duas opções, Figueiredo não descarta a possibilidade de o mundo passar por um período sem a vigência de um protocolo que regulamente metas de redução das emissões. “É uma possibilidade real termos um intervalo entre o fim do comprimento do primeiro protocolo de Kyoto e do segundo que ainda está porvir”, disse.

Figueiredo explicou que implementação provisória – medida que permite que a conclusão de uma negociação entre em vigor antes do período de ser ratificada por outras partes - é encarada de maneira diversa entre os países. “Alguns países têm mais dificuldade em aceitar isso do que outros. Não é uma tradição na América Latina, por exemplo, mas é muito comum em países anglo-saxões”.

Imperialismo em Copenhague

Outra aresta bastante polêmica nas negociações em curso são as conseqüências da cúpula anterior, em Copenhague, principalmente por conta da posição de Washington e outros, que insistem em condicionar o financiamento aos países em desenvolvimento, ignorando os princípios da Convenção Marco da ONU sobre Mudanças Climáticas. "Tem havido mecanismos de chantagem e pressão para que países em desenvolvimento mudem sua posição, para evitar serem penalizados com o não envio de auxílios (econômicos), como foram os casos da Bolívia e do Equador", lembrou o diplomata boliviano.

"Por nós não termos assinado o chamado Acordo de Copenhague", ressaltou, "os Estados Unidos cancelaram um auxílio de três milhões de dólares para ações de mudança climática na Bolívia, e, para o Equador, de 2,5 milhões de euros". Solón disse ainda que outros países em desenvolvimento certamente foram submetidos a pressões similares para apoiar esta proposta, que começa a mudar o princípio da convenção, de que todos temos responsabilidades comuns, porém diferentes.

"O que significa isso? Que os principais responsáveis pelo aquecimento global são fundamentalmente as nações industrializadas, que deram origem ao que foi o nascimento do capitalismo, 250 anos atrás", explicou o embaixador boliviano.

"Se pudéssemos examinar a atmosfera de maneira que nos permitisse ver onde foram feitas a maioria das moléculas de CO2 que existem, encontraríamos os dizeres 'made in EUA', 'made in países da União Europeia'", ilustrou Solón.

Distribuição injusta da atmosfera

Na sua opinião, há uma distribuição injusta da atmosfera, uma vez que 75 por cento das emissões de CO2 são provenientes de países desenvolvidos, que são identificadas no Anexo 1 da Convenção. "E os países em desenvolvimento, que representam 80 por cento da população mundial, têm uma participação de apenas 25 por cento nesta contaminação. Por isso essa questão das responsabilidades diferenciadas nocontexto de que todos temos que fazer alguma coisa", disse o embaixador.

"O que buscam com o acordo de Copenhague? Remover esta diferença. E então os Estados Unidos, a União Européia, o Japão, o Canadá e outros países passam a ser mais um, como se esse problema tivesse sido iniciado no ano passado ou há 10 anos atrás, quando na verdade o problema remonta há muitíssimos anos", disse ele.

Nos últimos dias, o Japão reiterou que não vai apoiar a proposta de estender o protocolo para além de 2012, apesar desse auspicioso documento ter sido aprovado em Kyoto, uma das suas emblemáticas cidades.

A reunião de Cancun, da qual participam representantes de quase 200 países, vai até o dia 10 de dezembro e será substituída em 2011 pela 17ª Cúpula, a apenas um ano do prazo de expiração do controverso Protocolo de Kyoto.

Fonte: Vermelho, por Luana Bonone, com informações da Prensa Latina e do IG

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