segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Cuba: O desastre do novo século

Por Dalia Acosta, da IPS

Havana, 12/09/2009 – Como o furacão de 1932, o Flora de 1963 ou o Michelle em 2001, a combinação fatal dos furacões Ike e Gustav ficará na memória histórica de Cuba como um dos maiores desastres naturais que esta ilha do Caribe precisou enfrentar. Quando ainda não se havia terminado a contabilidade dos danos causados por Gustav no dia 30 de agosto no ocidente do país, Ike entrou pelo leste na noite da última segunda-feira, saiu ao mar para se fortalecer e no dia seguinte voltou a atravessar a ilha de sul a norte pela província de Pinar del Rio, a cerca de 140 quilômetros de havana.

Antecedido pelas penetrações do mar na cidade de Baracoa, acompanhado de intensas chuvas e uma extensa área de influência com ventos que superavam os 200 km/h, Ike afetou praticamente todo o território cubano e sua população de 11,2 milhões de pessoas. Enquanto o ciclone se afastava ao norte pelo golfo do México, Cuba continua sofrendo rajadas de vento, chuvas, cheias de rios e inundações, e o governo de Raúl Castro punha toda sua ênfase no início dos trabalhos de recuperação, incluindo o restabelecimento dos serviços básicos de água, eletricidade e comunicações.

“Nada igual”, “um desastre”, “nem no caso do Flora”, “não lembro de ter vivido algo assim”, repetem as pessoas entrevistadas em algumas das localidades mais afetadas, onde a imprensa nacional conseguiu chegar com o apoio das máximas autoridades do país. Cinco pessoas morreram na ilha vítimas de Ike e há informes de 19 feridos, dados preliminares que podem aumentar com persistência das inclemências climáticas, mas consideradas insignificantes se for considerada a magnitude do desastre.

A redução ao mínimo possível das vítimas fatais se associa diretamente às medidas preventivas aplicadas pela Defesa Civil em Cuba. Até o último dia 9, mais de 2,6 milhões de pessoas foram evacuadas em todo o país, a maioria levada para casas de parentes e vizinhos, afirmou o coronel José Ernesto Betancourt. Fontes do Estado Maior da Defesa Civil informaram que para enfrentar o impacto de Ike foram ativados 1.236 órgãos de direção de leste a oeste, 2.300 abrigos estatais, 9.600 equipes de transporte e de carga. Aproximadamente 118 mil pessoas trabalharam nas tarefas de atenção e máxima proteção da população.

“Esta cidade retrocedeu pelo menos 70 anos. Está irreconhecível. Teremos de trabalhar muito para seguir adiante”, disse à IPS, por telefone, uma moradora de Holguín, um dos territórios mais afetados pela passagem do furacão a cerca de 700 quilômetros de havana. Tristeza, vazio, desolação. Imagens aéreas dos municípios de Banes e Gibara, em Holguín, mostradas pela televisão nacional, mostram populações inteiras devastadas, quilômetros e quilômetros de construções sem teto, enclaves econômicos e também casas de famílias total ou parcialmente destruídas.

“As imagens de casas e instalações destruídas, colheitas arruinadas, árvores derrubadas, rios transbordando, casas invadidas pelas águas em territórios planos, pessoas arrastadas pela força das correntes de água e salvas com desesperados esforços, eram desoladoras”, disse o ex-presidente Fidel Castro em uma carta enviada na quarta-feira ao programa de televisão Mesa Redonda. O mar penetrou terra adentor na localidade de Santa Cruz del Sul em Camagüey, e Caimito, Majana, la Sabana e El Corujal, em Havana. As intensas chuvas converteram a comunidade de Alacrán em um rio caudaloso e provocaram inundações em numerosos assentamentos e cidades como Matanzas, Ciego de Ávila e Camagüey.

Ike prejudicou mais de 200 mil casas em Cuba, das quais 30 mil caíram completamente, informou Victor Ramírez, presidente do Instituto Nacional da Habitação. Se forem somadas as afetadas por Gustav, são mais de 320 mil danificadas, a maioria ficando sem teto. “Muitos telhados estavam projetados para ventos menores do que os registradas nas últimas semanas’, disse Ramírez após percorrer o oeste dopais. As chuvas causam pelo menos 16 desmoronamentos, totais ou parciais, dado que pode aumentar quando terminarem as chuvas e o sol começar a secar estruturas umedecidas de um grande número de edificações que já estavam em franco processo de deterioração.

Enquanto o setor do turismo não informou danos importantes e o parque eólico de Gibana, inaugurado este ano como parte de um projeto nacional de energia renovável, suportou rajadas de vendo superiores a 220 quilômetros por hora, os danos são graves na zona produtora de níquel de Moa, no sistema eletro-energético e das comunicações. Ricardo González, diretor da União Elétrica Nacional, garantiu que Ike afetou as linhas de transmissão de todas as províncias do país, mas os microsistemas que funcionam com óleo combustível e diesel conseguiram suprir as necessidades vitais da população.

Na agricultura há informações de severos danos em plantações de tabaco e cítricos, importantes itens de exportação de Cuba. Também foram afetadas grandes extensões de cultivos em todas as províncias produtoras de alimentos, um golpe econômico que as autoridades pretendem ressarcir com a plantação acelerada de cultivos de ciclo curto. “Creio que o valor total dos prejuízos materiais e econômicos ainda vai demorar para ser conhecido, mas a meu ver poderá ficar entre dois bilhões e três bilhões de pesos”, disse Ariel Terrero, comentarista de temas econômicos da revista na televisão Buenos Dias.

Para este tipo de cálculo Cuba aplica a taxa oficial de câmbio do dólar pelo peso cubano de um por um. “Talvez esteja ficando curto”, acrescentou o jornalista. Nesse caso, Ike se situaria como o desastre natural de maior impacto econômico, superior ao causado pelo furacão Michelle, que em 2001 deixou cinco mortos, mais de 1890 mil casas afetadas e perdas econômicas estimadas em mais de 1,8 bilhão de pesos. (IPS/Envolverde)


(Envolverde/IPS)

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