quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Informações sobre a Captura e Armazenamento de Dióxido de Carbono (CO2 Carbon Sequestration - CCS)

Contexto político

Um objetivo fundamental da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (CQNUMC) (artigo 2.º) é: “estabilizar as concentrações de gases de efeito de estufa – GEE na atmosfera a um nível que evite uma interferência antropogênica perigosa com o sistema climático”. O Conselho de Ministros da União Européia - UE acordou que o aumento médio de 2 oC na temperatura global constitui um limite que não deve ser ultrapassado. O Conselho afirmou que, em consonância com aquele limite, os países desenvolvidos poderão vir a ter de reduzir as suas emissões de gases de efeito de estufa até 2020 entre 15 e 30% abaixo dos níveis de 1990, observando a provável necessidade de uma redução global na emissão de gases com efeito de estufa que poderá atingir os 50% até 2050.

A Comunidade Européia e os seus Estados-Membros ratificaram igualmente o Protocolo de Quioto no âmbito da CQNUMC, que exige reduções nas emissões de gases com efeito de estufa no período 2008-2012. Para tanto, em 2005 foi instituído um Regime de comércio de licenças de emissão da UE denominado “European Union Emission Trade Scheme - EU ETS”, aplicável a milhares de instalações na Europa, como por exemplo siderurgias, refinarias e centrais elétricas de capacidade superior a 20 Megawatts. Este Regime abrange cerca de 45% de todas as emissões de CO2 da UE (os restantes 55% de emissões provêm de outros setores industriais, dos setores de transportes e habitacional). A segunda fase do Regime acontecerá entre 2008-2012, paralelamente com o "primeiro período de cumprimento" do Protocolo de Quioto, e o sistema está concebido para prosseguir para além de 2012.

Análise geral dos conceitos e tecnologias relacionados ao CCS

O processo de captura e armazenamento de CO2, ou CCS, consiste na remoção do dióxido de carbono das emissões resultantes de fontes estacionárias industriais tais como centrais termo elétricas, cimenteiras, siderurgias, etc.... A seguir o CO2 é comprimido e transportado no estado líquido para ser armazenado numa estrutura geológica adequada. A Figura 1 mostra uma representação esquemática do CCS.

O CCS pode ser aplicado a todos os processos industriais que utilizam a queima de combustíveis fósseis (carvão, gás e petróleo) e de biomassa. Por conseguinte, pode-se afirmar que se trata de um processo que permite o uso continuado de combustíveis fósseis ao mesmo tempo que limita as emissões de CO2 para a atmosfera até que uma economia baseada no suprimento de energia a partir de hidrogênio e de energias renováveis esteja suficientemente desenvolvida.

O processo CCS é frequentemente analisado considerando sua aplicação com o carvão, uma vez que a quantidade de carbono contida nas reservas conhecidas de carvão é muito superior à quantidade que é possível emitir em segurança para a atmosfera, levando em conta a necessidade de evitar mudanças climáticas perigosas.

A partir do carvão é possível produzir não só eletricidade mas também combustíveis líquidos como o hidrogênio. Estes combustíveis líquidos derivados do carvão podem ser utilizados tanto nos transportes como na satisfação das necessidades domésticas em termos de conforto de temperatura. Contudo, pelo fato da sua produção a partir de combustíveis fósseis requerer uma utilização intensiva de energia, estes novos combustíveis acabam por contribuir para as mudanças climáticas induzidas pela ação do homem a menos que se utilize no processo de geração de energia com combustíveis fósseis e biomassa , o CCS.

Existem quatro tipos de reservatórios geológicos possíveis para armazenamento do CO2 capturado: i) reservatórios de petróleo e de gás esgotados (depletados); ii) campos de petróleo e de gás ainda operacionais, sendo o CO2 injetado no reservatório utilizado para uma melhor extração do petróleo (ou do gás) através do uso da técnica de recuperação avançada de petróleo ou gás com injeção do CO2; iii) aquíferos salinos profundos, constituídos por rochas porosas que atualmente contêm água muito salgada; e iv) camadas de carvão não exploráveis, nas quais o CO2 se adsorve à superfície do carvão. Os três primeiros tipos de locais de armazenamento podem ser do tipo onshore ou offshore. Normalmente, as camadas de carvão são do tipo onshore.

Globalmente, não se conhece com exatidão a capacidade dos potenciais reservatórios geológicos mas é provável que seja suficiente para permitir que o CCS desempenhe um papel significativo na redução das emissões de CO2 em inúmeros países. No Reino Unido, por exemplo, os reservatórios geológicos de armazenamento analisados de modo criterioso revelaram uma capacidade suficientemente grande para armazenar todo o CO2 proveniente da produção de eletricidade (nos níveis atuais) para os próximos 50 anos, pelo menos. Na Noruega e nos Países Baixos, os números publicados são semelhantes.

Há muito trabalho em curso no sentido de avaliar os riscos inerentes a uma potencial fuga ou escape do CO2 contido nos reservatórios geológicos de armazenamento. Tais riscos são específicos de cada reservatório, motivo pelo qual será necessária uma avaliação detalhada dos riscos em cada reservatório. O gás natural e o CO2 são encontrados na natureza em reservatórios geológicos e permanecem retidos nestas formações geológicas há milhões de anos, o que permite dizer que há boas razões para se pensar que é possível selecionar reservatórios geológicos onde o CO2 capturado possa ser armazenado por períodos de tempo muito longos para efeito de mitigação das mudanças climáticas. Subsistem algumas questões relativas à integridade dos poços existentes, motivo pelo qual serão necessários estudos para uma melhor avaliação desses riscos. A regulação da atividade de CCS deverá incluir requisitos específicos para monitoramento do local de armazenamento do CO2 durante, e também após, a fase de injeção. Poderão ser toleradas fugas muito reduzidas tanto em termos de impacto ambiental local como de impactos globais nas mudanças climáticas, mas esta situação depende de cuidadosa avaliação de riscos para a saúde e segurança do Homem e para os ecossistemas devido às fugas de CO2.

Custos

É quase sempre mais dispendioso recorrer ao CCS do que permitir que o CO2 escape para a atmosfera. Isto deve-se ao fato de que a captura do CO2 necessita uma grande instalação e consome muita energia – a denominada "penalidade energética" – para a separação e compressão do CO2. Por este motivo, a única justificativa para implementar a maior parte das aplicações de CCS é a redução das emissões de CO2 no sentido de minimizar as mudanças climáticas.

Uma instalação de captura pode remover 85 a 95% do CO2 existente no gás exausto da combustão. Considerando a penalidade energética de 10 - 40%, que varia significativamente em função da rota tecnológica de captura de CO2, da concepção e da idade da central elétrica e de outras condições locais, a redução de CO2 atinge de 80 a 90% por unidade de saída.

No Quadro 1 apresenta-se uma síntese dos custos de CCS. Expresso como o custo para evitar a emissão de uma tonelada de CO2, os custos adicionais para a maior parte destas tecnologias de CCS são da mesma ordem de grandeza de muitas energias renováveis e de uma nova instalação nuclear. O custo da eletricidade com CCS aumentaria cerca de 2 a 3 centésimos por kWh, representando um acréscimo de 20 a 80% no preço pago pelo consumidor final

Quadro 1: Variação de custos totais da captura, transporte e armazenamento geológico de CO2 com base na tecnologia atual para novas centrais elétricas (valores em € - base 2002)

Central elétrica com captura e armazenamento

Central elétrica de carvão pulverizado

Central de ciclo combinado de gás natural

Central de ciclo combinado de gaseificação integrada de carvão

Custo da eletricidade por MWh sem CCS (em €)

43-52

31-50

41-61

Custo da eletricidade por MWh com CCS (em€)

63-99

43-77

55-91

Aumento do custo de eletricidade por MWh (em€)

19-47

12-29

10-32

Aumento dos custos com CCS em %

43-91%

37-85%

21-78%

Custo por tonelada de CO2 evitada (em€)

30-71

38-91

14-53

Fonte: adaptado do Quadro 8.3a, página 347, IPCC (2005)

Incentivos

Uma vez que a produção de eletricidade com CCS custa sempre mais do que a produção equivalente sem este processo, o CCS só será implementado com incentivos financeiros específicos. A única exceção seria em locais para armazenamento geológico onde a captura do CO2 pudesse ser associada a uma melhor recuperação do petróleo, apesar de tal hipótese provavelmente só ocorrer num número relativamente reduzido de locais. Além disso, muitas empresas não deixarão de solicitar incentivos financeiros que contemplem os riscos relativamente elevados da atividade associados à implementação do CCS devido, por exemplo, às incertezas tecnológicas, de mercado e políticas. O Regime de comércio de licenças de emissão da UE constitui um incentivo deste genero, mas o preço atribuído por tonelada de redução de CO2 (entre 10 e 30 euros por tonelada de CO2) é inferior ao custo real (atual) do CCS por tonelada de CO2, especialmente quando não existe qualquer garantia de que esses preços se manterão tão elevados ao longo de todo o tempo de vida do projeto de CCS. Consequentemente, é possível que seja necessário um incentivo adicional. Foram propostos os seguintes mecanismos de incentivos.

a ) Um regime de subsídios mediante o qual os produtores de eletricidade que recorram ao CCS recebem das finanças públicas o custo adicional de CCS (por exemplo, através de uma tarifa de alimentação garantida para a eletricidade produzida com CCS que reflita os custos reais de implementação de CCS).

b ) Um regime de obrigação ou de exigência mediante o qual os produtores de eletricidade são obrigados a produzir uma certa fração da respectiva produção de energia utilizando o CCS (comparável ao programa Renewable Portfolio Standards ou à lei Renewables Obligation) ou uma exigência semelhante, mas sem especificar a fonte de produção de eletricidade com emissão reduzida, ou zero, de carbono.

c ) Um regime de apoio de subsídio em capital, mediante o qual as finanças públicas subsidiam os custos iniciais de capital de um projeto de CCS.

d ) Um imposto sobre o carbono extensivo a toda a economia, mediante o qual os usuários finais de combustíveis e eletricidade baseados no carbono pagam uma taxa por unidade de CO2 emitida. Isto significaria que os usuários domésticos, comerciais e industriais de gás, eletricidade e combustíveis derivados do petróleo pagariam uma taxa baseada no teor em carbono do combustível, constituindo deste modo um incentivo para o desenvolvimento de fontes de energia com teor baixo ou nulo em carbono tais como CCS.

e ) Um prolongamento do Regime de comércio de licenças de emissão da UE e sua ampliação para todo o mundo, com valores limite de emissões mais rigorosos: o Regime do comércio de licenças de emissão da UE podia ser prolongado para além de 2012 e podiam ser negociadas quotas nacionais de emissões mais rigorosas, elevando assim o preço da licença de uma tonelada de CO2. O Regime do comércio de licenças de emissão da UE podia igualmente ser alargado a todos os usuários de energia, e não apenas aos produtores de energia de média e grande escala.

g ) Apoio público a projetos de Pesquisa, Desenvolvimento e Demonstração do CCS.

Questões legais

A Convenção de Londres regulamenta a descarga de resíduos no mar. A Convenção OSPAR é um tratado regional para o Atlântico Norte semelhante à Convenção de Londres. O termo “descarga” está definido em sentido amplo de modo a incluir qualquer eliminação deliberada ou armazenamento no mar de resíduos ou outros produtos. Não é permitida a descarga de resíduos, salvo os indicados na lista e o CO2 não está atualmente incluído na lista. Provavelmente, será necessário modificar os tratados das Convenções de Londres e da OSPAR antes que ocorra o armazenamento de CO2 em aquíferos salinos profundos e em campos de petróleo e gás offshore, processo que pode demorar vários anos devido sobretudo ao pouco conhecimento que ainda existe sobre o impacto de fugas de CO2 para o ambiente marinho. Será necessário clarificar e modificar o enquadramento jurídico em vigor antes do CCS se transformar numa tecnologia bem definida para diminuição do carbono. É improvável que as empresas iniciem grandes investimentos em tecnologia de CCS num domínio de potenciais conflitos com as disposições das Convenções de Londres e da OSPAR. Está atualmente em curso um processo para modificar a Convenção de Londres e há uma proposta de alteração no sentido de acrescentar o CO2 ao anexo, para que este possa ser descarregado desde que ele seja armazenado em formações geológicas submarinas (não diretamente injetado na coluna de água), seja principalmente constituído por CO2 e não contenha resíduos adicionais.

Figura 1: Representação esquemática da Captura e Armazenamento de CO2

Fonte: Relatório Especial do IPCC sobre Captura e Armazenamento de Dióxido de Carbono

Tradução das Legendas da Figura 1 do inglês para português:

Inglês

Português

Gas to domestic supply

Gás para abastecimento doméstico

Natural gas + CO2 capture

Gás natural + captura de CO2

CO2 geological storage

Armazenamento geológico de CO2

Industrial uses

Usos industriais

Mineral carbonation

Carbonatação mineral

Oil

Petróleo

Gas

Gás

Biomass

Biomassa

Coal

Carvão

Ocean storage (ship or pipeline)

Armazenamento oceânico (navio ou duto)

Cement/steel/refineries, etc.

Cimenteiras/siderurgias/refinarias, etc.

Electricity generation

Produção de eletricidade

Petrochemical plants

Instalações petroquímicas

+ CO2 capture

+ captura de CO2

Future H2 use

Futura utilização de H2

Fonte: Ambiente Brasil

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