quarta-feira, 28 de maio de 2008

IPCC ‘divide’ Nobel da Paz com dois mil pesquisadores

Por Manuel Alves Filho, da Unicamp

Em 2007, os organizadores dos prêmios Nobel surpreenderam a comunidade científica e o público em geral ao conceder a láurea, na categoria Paz, ao ex-vice-presidente dos Estados Unidos, Al Gore, e ao Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), órgão da Organização das Nações Unidas (ONU). A honraria foi o reconhecimento maior ao esforço de ambos para difundir os conhecimentos relativos às mudanças climáticas, iniciativa que contribuiu para lançar os fundamentos das ações voltadas à minimização do problema. Decorridos alguns meses, a direção do IPCC também decidiu causar surpresa ao compartilhar o prêmio, ainda que simbolicamente, com os cerca de 2.000 cientistas de todo o mundo que cooperam com suas atividades. Entre eles estão perto de 30 brasileiros. Três deles são professores da Unicamp.

Mudanças climáticas renderam premiações

“Não esperava ser lembrando, pois considero minha contribuição modesta. Fiquei contente, mas penso que o crédito é dos autores das pesquisas”, afirma Gilberto Jannuzzi, professor da Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM), que atua desde o ano 2000 como revisor de estudos que subsidiam as análises do Painel. Além de Jannuzzi, foram lembrados pelo IPCC Arnaldo da Silva Walter, também docente da FEM, e Eglé Novaes Teixeira, professora da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC). O trio recebeu uma carta de agradecimento assinada pelo presidente órgão, Rajendra Pachauri. No texto, ele divide simbolicamente o Nobel com os colaboradores.

Os três cientistas foram agraciados ainda com uma espécie de certificado contendo a reprodução do diploma conferido pela organização do prêmio ao organismo da ONU. Para Eglé, a atitude do IPCC foi simpática. “Fico feliz porque se trata de um reconhecimento ao trabalho feito pelos pesquisadores que cooperam com o órgão”, considera. Ela contribuiu com um estudo realizado em 1999, cujo relatório foi publicado no ano seguinte. A pesquisa, explica a docente, foi sobre gases que ajudam a agravar o efeito estufa. “Trabalhei com a questão dos resíduos sólidos, mais especificamente com a problemática da geração do gás metano, um dos que mais contribuem para o aquecimento global”, explica.

Atualmente, Eglé não está desenvolvendo qualquer estudo que servirá às análises do IPCC, mas adianta que tem interesse em voltar a colaborar com o órgão. “Até cheguei a ser convidada para participar de um segundo trabalho, mas fui forçada a recusar em razão de compromissos assumidos anteriormente”. Já o professor Jannuzzi está envolvido com um novo projeto associado ao Painel. Ele participa, agora como autor, de uma comissão que formulará propostas para o uso de fontes renováveis de energia, voltadas à mitigação do efeito estufa. “A comissão é formada por cerca de 100 cientistas de todo o mundo. Teremos dois anos para concluir o trabalho. Minha atuação será mais especificamente na área de integração de renováveis”, adianta o docente da FEM.

O IPCC – Criado em 1988, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) é um órgão da Organização das Nações Unidas (ONU). Nele estão representados aproximadamente 130 países. Sua principal função é promover avaliações regulares sobre a mudança climática em escala mundial. Desde a sua fundação, o IPCC tem elaborado relatórios em torno do tema, sempre com a colaboração de um amplo grupo de cientistas, de todas as áreas do conhecimento e de todos os cantos do planeta. O primeiro documento do gênero foi publicado em 1990.

Ao todo, o Painel já produziu quatro relatórios, todos eles divididos em quatro etapas. O último, divulgado em 2007, trouxe novas evidências científicas sobre o aquecimento global e acerca da contribuição da ação humana para o agravamento do fenômeno. O documento ainda trouxe dados sobre as conseqüências do problema para o ambiente e a economia e elencou uma série de medidas para minimizá-lo. Foi graças a esse trabalho que o órgão dividiu o Nobel da Paz com Al Gore. Logo após a divulgação do prêmio, o presidente do IPCC, Rajendra Pachauri, fez a seguinte declaração: “Espero que este prêmio coloque a questão [do aquecimento global] no primeiro plano e que isso provoque uma maior tomada de consciência e um sentimento de urgência”. E concluiu, em tom de advertência: “O aquecimento climático ameaça desestabilizar as atividades econômicas e a estabilidade social no mundo”.

Crédito da imagem: Antoninho Perri


(Envolverde/Unicamp)

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