quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Amazônia Legal

Rodrigo Brito (*)

O tema da manutenção ou não da “Amazônia Legal”, como base territorial à definição da reserva legal das propriedades rurais, localizadas na Amazônia (bioma) e, em parte, de seu entorno, tem despertado paixões e acirrado as discussões sobre esse tema.

Muitos defendem que é uma impropriedade a adoção do termo “Amazônia Legal” para fins da definição dos percentuais de reserva legal, pois esse conceito – que é geopolítico, e não fitofisionômico - além de deturpar os efetivos limites geográficos da “Amazônia Real”, ou seja do Bioma Amazônico, abocanha, em conseqüência da sua delimitação geográfica (dada a partir da MP 2080-58, de dezembro de 2000) imensas áreas do bioma Cerrado.

Em conseqüência disso, dá-se tratamento desigual às propriedades rurais localizadas no Bioma Cerrado, situadas dentro desse perímetro (da Amazônia Legal), em relação às demais, que se encontram fora deste. Enquanto que a reserva legal mínima para as áreas de Cerrado é de 20%, nas demais regiões do país, para as propriedades rurais, localizadas dentro da Amazônia Legal, a reserva legal é de, no mínimo, 35%. Isso diminui a área passível de exploração econômica em até 15%, nos cerrados localizados na Amazônia Legal.

Além disso, há outras queixas dos produtores, cujas áreas se inserem nesse perímetro: os seus custos de produção são maiores, devido a outras dificuldades - não enfrentadas pelos que se encontram fora da Amazônia Legal – estes tem que conviver com problemas não enfrentados pelos demais, no caso, os custos de transporte de insumos e de escoamento de safra e produção, distância dos mercados consumidores, etc.

Fora isso, esses têm agora que conviver com a confusão estabelecida pela MP 2080, que classificou áreas de Cerrado com sendo “Amazônia Legal”, carregando, além das dificuldades acima expostas, o estigma de serem tachados como “destruidores da floresta”, quando, na verdade, encontram-se em bioma diverso do amazônico, devida e precisamente localizado pelo IBGE e instituições nacionais e internacionais de pesquisa.

Sob o ponto de vista ambientalista, seria um verdadeiro “apocalipse” a reversão ao status anterior, em que: a Amazônia era a Amazônia, e o Cerrado era o Cerrado. Na visão desse setor, seria altamente temerária essa mudança, pois presumem que o ritmo da destruição da floresta poderia ser acelerado, além de colocar em risco a proteção do Cerrado.

Mas, a Amazônia e o Cerrado estão salvos apenas com isso? É a solução?
Será que voltarmos à definição da Amazônia (Bioma) como a Amazônia Real, poderá prejudicar o tal “desenvolvimento sustentável”? E aí surge outra questão: temos, em andamento, políticas publicas voltadas a chegarmos “perto” do que seja o tal desenvolvimento sustentável?

Quais os parâmetros que nos permitem acreditar que na “Amazônia Legal” existem indícios de que, da forma como está essa sendo administrada – sem presença do Estado, sem regularização fundiária, sem ordenamento territorial, com IDH negativo, etc. – não veremos, num futuro próximo, o mundo reconhecer a nossa Amazônia, em relação à floresta, dos nossos países vizinhos, como a “Amazônia Ilegal”?

A discussão sobre a expressão “Amazônia Legal”, “Amazônia Bioma” ou a “Amazônia Ilegal” é secundária. O fato é que as Medidas Provisórias (atualmente a MP 2166/67-2001 e as anteriores) se demonstraram incapazes de garantir a exploração sustentável da Amazônia, pois nela existe, única e exclusivamente, um conjunto de proibições. Doze anos depois, são suficientes para evidenciar que os mais de 20 milhões de habitantes (pobres), que lá habitam, não conseguiram se ajustar a essas regras, normas essas que sequer possuem fundamentação – lógica ou não – até hoje não se sabe sequer quem escreveu seu texto, e nem há defesa técnica e cientifica capaz de convencer de que sua manutenção é o caminho a ser seguido.

Apenas se sabe o que não queremos: destruir e usar a Amazônia de forma insustentável, em desacordo com as suas vocações e a sua importância no contexto nacional e mundial. Porém, a grande verdade é que não sabemos como chegar onde queremos e que o modelo adotado já mostrou que não nos levará até lá.

Não vejo que essa medida provisória possa dar rumos efetivos, com destino ao desenvolvimento sustentável. Esse não se alcança sem um ordenamento territorial e adoção de políticas econômicas, alicerçados na ciência, legalidade, educação, presença de estado – para orientar e também punir – mostrando que ainda existe lei no país, indicando o que pode ser feito e aonde, em que nível, de que forma, e com a adoção de políticas claras de incentivos e restrições às atividades, associadas a um comando e controle, para que tenham eficácia.
Esta foi e tem sido a única fórmula de sucesso e que se mostrou viável em outras partes do mundo. Todas as demais soluções, lastreadas, unicamente, no poder de polícia e comando e controle fracassaram.

Assim sendo, penso que a correção do equívoco da definição da Amazônia Legal é apenas um dos problemas existentes no Código Florestal, e que precisam de reajustes. Não podemos perder o timming e deixar de discutir essas questões de modo claro e aberto.

O governo precisa reconhecer que a manutenção dessa situação poderá tornar essa ingovernabilidade mais insustentável ainda, podendo chegar a um ponto irreversível, ponto este onde todos temos muito a perder.

* Assessor Técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) para as Áreas do Meio Ambiente e da Amazônia Legal.

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