quarta-feira, 2 de maio de 2007

Estudo apóia tese de hidrelétrica "limpa"

RAFAEL GARCIA
da Folha de S.Paulo

A maioria das usinas hidrelétricas brasileiras é limpa, mas a expansão do sistema nacional pode reduzir a atual capacidade do país de gerar energia sem emitir muitos gases causadores de efeito estufa. A tese da hidroeletricidade "ecológica" está sendo reforçada por análises que Furnas Centrais Elétricas vem conduzindo em suas instalações no cerrado, mas cientistas temem que a conclusão não seja aplicável a todos os casos.

Nas usinas onde a pesquisa está mais avançada --Serra da Mesa (Goiás) e Manso (Mato Grosso), ambas em região de cerrado-- a emissão nociva de carbono medida pelos cientistas chega a ser de um centésimo quando comparada a uma termelétrica a gás e óleo combustível de igual potência.

"A gente verificou, com muita satisfação, como essa matriz [hidrelétrica] é limpa", disse à Folha André Cimbleris, pesquisador de Furnas que coordenou as medições. O trabalho envolveu o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), a UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e o IIE (Instituto Internacional de Ecologia, de São Carlos). Segundo os cientistas, é a primeira vez que se fez um trabalho com medições de emissão de gases em vários pontos dos rios, das represas, em várias profundidades e em várias épocas do ano.

O otimismo com relação ao assunto, porém, diminui quando se leva em conta que a maior parte do potencial de expansão da matriz hidrelétrica brasileira está na Amazônia. Isso acontece porque a maior parte dos gases-estufa emitidos por uma represa sai das árvores que morrem submersas.

Como a vegetação inundada por represas amazônicas é mais exuberante, as usinas daquela região tendem a emitir mais carbono do que as do cerrado.

"Em média, na Amazônia, as florestas possuem de 250 a 400 toneladas de fitomassa [vegetais] por hectare. Já em Serra da Mesa, que é um cerrado rico, esse número cai para 33 toneladas", explica Cimbleris. Segundo o pesquisador, porém, ainda assim são raros os casos em que uma hidrelétrica emite gases-estufa em quantidade superior à de uma termelétrica.

Os resultados da pesquisa coordenada por Furnas são bem mais otimistas do que os que vêm sendo publicados pelo biólogo Philip Feanside, do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), que se opõe à definição de hidroeletricidade como "energia limpa".

Nas estimativas de Fearnside, hidrelétricas como Balbina, no Amazonas, e Tucuruí, no Pará, emitem mais carbono do que termelétricas de mesma potência. Segundo ele, a emissão de gases-estufa aprisionados na água de uma represa sobe exponencialmente quando o líquido passa pelas turbinas.

"A água que passa pelas turbinas perde pressão e a capacidade de aprisionar gás", diz, recorrendo a uma metáfora. "O gás é liberado, do mesmo modo que ocorre quando abrimos uma garrafa de Coca-cola." Segundo Fearnside, as usinas das regiões de cerrado também não ficam livres desse fenômeno.

Furnas, porém, diz ter levado isso em conta ao fazer seus cálculos para comparar usinas hidrelétricas às termelétricas. "Nós fizemos a medição a jusante [rio abaixo] das represas", diz Cimbleris. Com esse dado é possível estimar o gás dispersado na área mais crítica dos reservatórios, diz.

Segundo José Galízia Tundisi, do IIE, que participou dos estudos no cerrado, o método deverá ser aplicado também em pesquisas na Amazônia, para que se possa conhecer os rios mais adequados para construir usinas. "É preciso escolher estrategicamente quais rios vão ter as represas e quais deverão ficar preservados para a posteridade". A emissão de gases-estufa, diz, será um fator importante a ser considerado.

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